sábado, 20 de agosto de 2016

Aponte onde dói

Queria eu que a dor de um adeus não doesse assim, no peito. Gostaria que doesse no dedo mindinho. Sabe aquela dorzinha safada quando o mindinho bate no canto de um móvel? Seria bem melhor. Falo isso porque essa dor no peito dificulta tudo: respirar é difícil, o ar não passa, engolir a comida é complicado e até a cerveja gelada desce engasgando, em direção a um vazio chamado estomago irritado. É como se tivesse uma mão esmagando o teu coração até ele encolher. E fica pior quando você passa o dia entalada com um choro preso, pois a nossa rotina louca não nos permite nada além de se manter forte, porque sabemos que o mundo nunca parou e nem vai parar para enxugar as lagrimas de um coração partido. Não somos especiais. Mas se doesse no dedo mindinho eu daria um jeito de ficar bem. Eu colocaria gelo, faria uma massagem com gel de cânfora e rapidamente pararia de doer, bem instantaneamente mesmo. Mas essa dor no peito é cretina, não vai embora, não se encaixa em nada bonito, talvez sirva pra uma crônica boba e só. Cara, você não disse nada. O teu silencio upou a minha dor e me fez pensar nas varias possibilidades de transferir essa dor no meu peito para outros lugares do meu corpo. Foi tudo tão rápido que eu nem sei dizer como diabos fui parar aqui, imaginando como seria se a dor de um adeus doesse, sei la, no sovaco. 


quinta-feira, 18 de agosto de 2016

fragmentos musicais

E uma cara embrigada no espelho do banheiro. É como se a minha vida fosse feita de pequenos fragmentos – e ok, de fato é, e pra cada um deles houvesse uma trilha sonora. David Guetta ou Diplo para fazer o make up antes de sair. Rammstein, Pantera, Slayer pra malhar. Trap ou funk pra dançar. Radiohead ou Elliott Smith pra chorar em posição fetal. Chitãozinho e Xororó pra cantar de forma saudosista com a melhor amiga. Enfim, eu realmente amo todas as sensações maravilhosas que a musica me proporciona.  Facilmente consigo lembrar de uma época e automaticamente das musicas que eu mais ouvia naquela fase, com aquelas pessoas e pronto: lá vem o turbilhão de sentimentos. Incrível como algumas musicas sempre doerão no nosso peito. Por exemplo, como superar Angie dos Stones quando um antigo namorado te dedicou antes de morrer? Evitando-a por um longo tempo, claro, mas sem nunca fechar os olhos pra beleza que pode existir naquilo que dói na gente. As musicas e as dores da gente podem até se renovar, mas algumas dores antigas continuam em algum lugar escondido dentro de nós, só esperando o start, e cabe a gente fazer o manejo certo das emoções. Foi bonito? Verdadeiro? Sincero? Fica.


Pelo nosso momento (e pela referencia do final),

para I.P.

sexta-feira, 29 de julho de 2016

Clube dos deslocados


Todos os dias a gente se vê pedindo serenidade à qualquer força que seja maior que a nossa existência minúscula. Todos os dias a gente vê egos cancerígenos que vão minando qualquer tentativa de leveza e amenidades. Todos os dias a gente vê gente pagando de evoluído com citações ou felicitação rasas de verdade. A gente vê gente mascarada visando uma fatia de bolo num futuro que elas nem sabem se um dia vai chegar.  A gente vê gente achando que está no topo do mundo, sem nunca nem ter saído do primeiro piso. A gente vê gente descartando gente como quem descarta um copo de plástico - porque as relações egoicas sempre serão superficiais. A gente vê o nosso bom humor dando o último suspiro. A gente vê e sente muito - porque o maior problema dos deslocados nisso tudo, sempre foi esse:  ver e sentir demais.



terça-feira, 17 de maio de 2016

Qual a parte mais bonita do seu corpo?

Conversando com um amigo esses dias sobre bundas e peitos, tive uma das opiniões masculinas mais esclarecedoras em relação a visão da maioria dos homens sobre o corpo feminino. Mas não é sobre isso que quero falar. Então, qual a parte mais bonita do seu corpo? Não é a parte que as pessoas dizem ser a mais bonita, é a parte que você mais gosta, que mais te agrada de verdade, ou até te excita mesmo. A minha parte escolhida é única, eu nunca vi beleza nessa parte em outras pessoas, talvez por isso seja a minha preferida. Gosto de outras partes, mas sempre tem algo ali ou aqui que eu mudaria. Mas a tal parte que eu mais gosto, não. Não mudaria nada. E nem tatuaria. Essa parte não é nenhum segredo, eu só não ando é espalhando por aí, fazendo exposição da minha beleza particular. É tão delicada, tão sutil, tão minha que não há espaço para banalizações. Poucos são aqueles que reconhecem uma beleza não pública. É uma tenuidade que deve ser descoberta casualmente, num comedido levantar de vestido, na singularidade de uma carícia delicada ou num toque diligente de alguém que, olha e percebe, assim, por acaso. Estou isenta de modéstia, com licença e obrigada. Elogios de frigorífico já me cansaram. Queria mesmo era que notassem e elogiassem, quem sabe, essa tal parte. Mas tudo isso não é uma charada e nenhum tipo de provocação lançada para quem me ler. Mas confesso, não nego, eu queria sim que alguém tomasse parte dessa minha tal parte.

Imagem: Uma sereia, John William Waterhouse.




Cartinhas & tarô

Foi quando me dei conta que eu poderia ser o que eu quisesse: santa, puta, doce, ácida, crua & tua. Eu poderia ter a minha arcada dentaria tatuada em ti, bem ali assim: a minha mordida exposta na tua pele, te mastigando através dos meus desejos mais sinceros. Então eu enxerguei a minha loucura através dos teus olhos. A tua dor foi me consumindo, e ao invés de sentir o peso dessa dor nos meus ombros, eu escolhi te ter em meus braços com tudo embutido e misturado. Tantas ressacas de tantas noites, e ainda faltam tantas risadas para além. Baby, eu não sou nada fácil, mas arranco a tua tristeza com cerveja e Jorge Ben. Eu amo me sentir livre, sempre fui assim: mente aberta, coração alerta. Mas evito sucumbir à dor de ser do mundo. Que é uma dor oca, com pitadas de frieza.  Uma dor à la Holly Golightly, sabe? De quando surge no céu uma cor assim bonita, diferente do azul habitual, e a gente fica lá parado sem cansar de olhar com os olhos encantados, entende? Mas no dia seguinte o torcicolo. E sempre foi assim: a minha bagunça fluída e a tua coisa toda tão certa - como bem disse o Veloso. Baby, eu não sou nada fácil, mas sempre volto em sete dias.




sexta-feira, 11 de março de 2016

Caminho de volta

14 dias para o reencontro. E naquele semblante sereno eu vou repousar o meu nem tão. Num abraço quente e cheio de saudades vou me enternecer. Harmonia cósmica resultante num vôo desnudo que conduz a existência minúscula ao equilíbrio. Quando estou em seus braços, sinto-me em casa. Sim, tomei do mar a minha morada e tudo agora é ressignificação. Abrigo horizontal de todos os medos e angustias; carregador da força interna e o lar da Rainha que me ensinou a ter coragem pra abandonar as desesperanças.

E não há dissabores nessa vida que me tire o ritmo das ondas que carrego no peito. Contando.


quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Sobre encontros e ressacas

Uma embriaguez de vodca, tequila e cerveja pode te anestesiar, até você começar a sentir a própria língua enrolar e a pronuncia da palavra “tranquilo” se tornar engraçada, pode também te tornar alguém atrevido, destemido, daqueles que falam seus pensamentos em voz alta, desconhecendo o pudor da etiqueta ou conveniência. E quando nos damos conta, estamos evocando pensamentos até a cabeça começar a doer, inquietos, reclamões, futucando o peito lá no fundo tentando encontrar um pouco mais da gente. E como somos estúpidos fugindo de nós mesmos. É bobagem, é cilada, é triste não sabermos quem somos de verdade. Por exemplo, quando eu pergunto o que você espera da vida, eu não quero saber dos concursos que você espera passar ou se já passou, eu não quero saber qual é o carro dos seus sonhos ou se você vai fazer doutorado no exterior. Nós podemos e devemos ter nossas ambições, é lindo também, mas viver é mais uma questão de ser do que ter, e se a gente não colocar isso na cabeça de uma vez por todas, vamos nos tornas meros colecionadores de notas & pessoas. E como ser feliz num mundo onde nós não sabemos significar o que realmente importa? Afinal, você sabe como eu me sinto quando estou perto de você? O tipo de energia que você passa quando olha nos meus olhos? No fundo o que faz sentindo para que a gente mova nossos encontros aí pelo mundo, é isso: tesão pela vida, energia interna e brilho no olho. 

                                  

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Vai passar e não se morre disso

Depois da negação, a realidade. Estes mesmos olhos já olharam fixamente para outros tetos, em outras situações e diferentes intensidades. Já descobrimos que não se morre disso, mas é vital não enlouquecer com as lembranças doces e tampouco com as amarguras de um passado mal enterrado por palavras não ditas e ações paralisadas. Descobrimos também que não se fica louco disso. Loucura só se for de idéias floridas dentro da cabeça. A moça do cafezinho disse que Deus tem um propósito pra gente e que devemos ser aliados do tempo. Mas como se aprende a viver o tempo? Como se adaptar com as suas pausas e avanços? Não sabemos esperar, queremos tudo e queremos agora. Existe uma urgência dentro da gente implorando por doses de imediatismo. Mas em tempos de Vai Passar a gente se agarra a todas as energias: deuses, astros, orixás.  E se o peito dói, a gente pede força pra Obaluae, se a estrada ta escura a gente pede luz nos nossos caminhos pra Ogum, se falta crença a gente pede fé pra Jesus Cristo e se houver qualquer sinal de ódio a gente pede amor pra Iemanjá. Também acendemos diariamente incensos de sândalo pra perfumar a casa e a alma, fazemos orações pedindo por nós e pelos nossos, fazemos faxina na casa, mudamos moveis de lugar, compramos roupas novas e separamos outras pra doação, passamos a ter disciplina com a academia, porque liberar endorfina é bom e pode te deixar com o bumbum na nuca, assistir Machete porque é tradição e o filme mais indicado pra tempos difíceis. Vale tudo, inclusive oito temporadas do Dr. House no Netflix pela frente.

Vai passar, todo mundo sabe. Sempre passa e não se morre disso.




quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

A concha

Azul sempre foi sua cor preferida. Das coisas que mais amava na vida lá estava o colorido que pertencia aos seus olhos. Gostava de mar, da revolta das ondas e de brincar com as espumas – que parecia bastante com as do copo de cerveja de seu pai; acreditava piamente que seria aspirado para o fundo do mar e que não seria devolvido nunca mais para o fixo permanente. Viveria nas profundezas do oceano como num filme de aventuras fantasiosas, com direito a sereias e piratas.

Certa vez, à procura do fundo do mar, cavou com as próprias mãozinhas delicadas um buraco na beira da praia ate cansar e cair num pranto desolado no colo de sua mãe, que o enchia de carinho a cada frustração.

Ainda criança mudou-se de cidade, devido à transferência de emprego de seu pai. O fato de não ter mais o litoral ao seu alcance como sempre tivera, causou-lhe uma tristeza intensa. As crianças vizinhas adoravam os típicos passeios locais infantis, como ir ao shopping ou a clubes aquáticos, mas ele, não. Achava tudo muito chato! Por conta disso, sua mãe, comovida e sempre preocupada, confortou-lhe com um presente que seria o seu amuleto para o resto da vida, uma concha, daquelas que contem as impressões de ouvir o barulho das ondas. Era um mero esqueleto de molusco, mas muito significativo ao pequenino. Ele passava horas com a concha encostada ao pé do ouvido.

Com as possibilidades de criação que o papel crepom sempre oferecera, uma caixa d'água e a areia que dispunha no quintal de sua casa, criou sua própria praia. Uma praia que lhe bastava à alma. A mãe do garoto sempre observava suas brincadeiras da cozinha com muita ternura no olhar enquanto preparava as refeições da família. 

O tempo passou. Ele vingou como ser-humano-vida-clichê. Emprego, casa, casamento, filhos e responsabilidades. Sua imaginação infantil foi sendo engolida pelas mazelas da vida adulta. Tornou-se um bom homem, porem, uma sombra da criança sensível que um dia fora. Mas nas férias é sagrado: praia com a esposa, filhos e netos. Dentro da bagagem: a concha. E quando o
peito aperta de saudade de sua mãe e ninguém está por perto observando, ele afunda os pés na areia, eleva a concha ate o ouvido esquerdo e sorri tranqüilo olhando para o céu.


para ela: R. M. G. C



sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Silencio sui generis

Dizem que ainda existe a espera do motor do carro que aguarda lá fora. Dizem que houve choro e arrependimento diante dos sentimentos inacabados, aqueles desencontrados que insistem em coçar no peito da gente. Dizem também que existe o desejo de abrir a porta para que você entrasse, depois de um “e aí?” meio sem jeito, assim de saudade. Pensaram que talvez eu pudesse te servir uma cerveja artesanal, daquelas que sobrou do natal, enquanto o humor sarcástico e despretensioso tomava conta do ambiente. No entanto, baby, não precisa aparecer, não. Sua presença já está esmagando os meus pensamentos. Você surge numa balada de Blues Rock, surge também naquele seriado do Ryan Murphy e Brad Falchuk, no clássico do Max Romeo, no 9gag, e quem diria, você surge até mesmo num romance empoeirado do Hesse que tirei da estante. Eu me basto, por hora, entendendo que é uma contradição dispensável querer a sua presença.